Vendée Globe - o começo

O barco de Charlie Dalin, líder da flotilha na segunda semana da regata. Foto: Charlie Dalin

descendo

o Atlântico

Por Roberto Negraes

Um resumo das duas primeiras semanas da Vendée Globe

Foram quarenta os veleiros Imoca de 60 pés que largaram no último dia 10 de novembro de Les Sables d'Olonne, iniciando a décima volta ao mundo mais competitiva do planeta. A festa foi fantástica no pequeno porto francês, com o comparecimento, segundo a organização, de 400 mil pessoas de diversos países, para saudar e despedir-se dos navegadores solitários.

A Baía de Biscaia teve navegação lenta, com ventos fracos, mas a reputação do Atlântico Norte foi salva por uma forte tempestade com ventos de 25 a 40 nós (46 a 74 km/h) no Cabo Finisterra (Espanha), onde os skippers começaram a mostrar a que vieram. Contudo, o mau tempo pouco durou e, na verdade, a descida do Atlântico ao largo das costas portuguesa e africana foi marcada por calmarias e indecisões. Onde tem vento? Ninguém encontrava. Assim, um novo líder emergia a cada dia.

Vista a partir do MACSF. Foto: Isabelle Joschke

Rei Jean e primeiros dramas

A torcida francesa comemorou quando, de repente, seguindo para uma rota inesperada e improvável, próximo da costa africana e passando pelas Ilhas Canárias e Cabo Verde, o apelidado "roi Jean” (rei Jean) tomou a liderança. Um dos mais conhecidos e festejados navegadores franceses, Le Cam, aos 66 anos de idade, é o mais velho e experiente desta competição. Ele participou de seis Vendée Globe. Em uma delas, em 2009, naufragou e foi salvo por outro participante (Vincent Riou); em 2020, foi a vez do próprio Le Cam salvar outro companheiro náufrago (Kevin Escoffier). Seu atual veleiro, o Tout Commence en Finistère - Armor Lux, é o mais novo da flotilha e, apesar projeto moderno, não tem hidrofólios.

O primeiro drama desta Vendée Globe envolveu Maxime Sorel, capitão do V e B - Monbana - Mayenne. Houve uma quebra em peças que sustentam a vela mestra, e ao tentar repará-las, Sorel caiu do mastro e sofreu ruptura de ligamentos na perna direita. Ele ainda tentou revolver o problema que o impedia de usar a vela, mas as fortes dores não lhe permitiam sequer movimentar-se pelo convés. Com isto, Sorel, que é um dos bons navegadores da França, viu-se forçado a rumar para a Ilha da Madeira, onde abandonou a disputa menos de uma semana após a largada.

Em 16 de novembro, sétimo dia de regata, perto de Cabo Verde, a organização recebeu a comunicação sobre danos em um segundo barco. Desta vez foi o Bureau Vallée, de Louis Burton (França), que reportou problemas estruturais no casco. Depois de ouvir fortes estalos durante a noite, ele constatou, pela manhã, que o convés sofrera grandes rachaduras. A notícia causou impacto na flotilha, já que Burton era um dos favoritos: posicionado entre os líderes da regata naquele momento, o velejador francês foi obrigado a praticamente parar seu barco para dedicar-se a reparos quase impossíveis. Inicialmente, ele cogitou abandonar, mas não demorou muito para sua equipe e organização serem avisados de que os danos foram consertados com sucesso e que o Bureau Vallée, embora mais de 300 milhas (555 km) atrasado em relação aos rivais, estava de volta à regata.

Recordes de singradura

No geral, a alegria e o bom humor andam soltos entre os participantes. O skipper do Holcim-PRB, Nicolas Lunven (França), estreante na Vendée Globe, teve um início incrível. No dia 13 de novembro, quarto dia de regata, ele bateu um recorde de distância percorrida em 24 horas (singradura) solo em veleiro monocasco, ao completar 546,60 milhas (1.012,30 km), mostrando o potencial excepcional do seu barco, que já detém o recorde de singradura tripulada (640,48 milhas, ou 1.186 km), obtido na quinta etapa da regata volta ao mundo Ocean Race em 2023, com velocidade média de 26,68 nós (49,41 km/h).

Evidentemente, ninguém quer ficar atrás. Na mesma semana, Yoann Richomme (outro francês entre os favoritos), no comando do Paprec Arkéa, superou a marca do Holcim-PRB, navegando 551,84 milhas (1.022 km), entre os dias 19 e 20, em condições quase perfeitas. No entanto, poucas horas depois ele estava praticamente parado, sob sol forte e nenhuma brisa, flutuando em um quase lago de calma, em pleno Atlântico Norte.

De fato, até quinta-feira, dia 21, a regata se caracterizou pela dificuldade em se encontrar vento favorável para o rumo Sul, onde os ventos "rugidores" aguardam os navegadores. Contudo, a partir desse dia, os barcos encontraram o impulso que procuravam e passaram a descer ao largo da costa brasileira com muita velocidade. E o líder? O Macif Santé Prévoyance, de Charlie Dalin (França), assumiu de repente a frente de batalha.

No domingo, 24 de novembro, a Vendée Globe completou duas semanas desde a largada e o grupo que lidera a regata pegou o expresso para o Cabo da Boa Esperança. Uma grande área de baixa pressão surgiu no leste do Brasil, levando com ela os Imoca ávidos de vento.

Roberto Negraes