Vendée Globe Real e Virtual - 9-1-2021

Seguin avisa, sutil: “vocês não estão tão longe assim”

Seguin avisa, sutil: “vocês não estão tão longe assim”

Sem uma mão e sem hidrofólios

Um campeão paraolímpico e seu IMOCA ameaçam os atuais líderes da Vendée Globe

Damien Seguin (Groupe Apicil) é mais um skipper em destaque depois do Cabo Horn. Contando apenas com uma mão (nasceu sem a esquerda) e um veleiro sem hidrofólios, aproxima-se dos líderes

Assumindo a quarta posição na Vendée Globe pouco antes de cruzar o Cabo Horn, Damien Seguin decidiu por uma estratégia de navegação para leste-nordeste ao chegar ao Atlântico. Sua escolha vem dando frutos, e a distância que o separava dos líderes Yannick Bestaven (Maître Coq), Charlie Dalin (Apivia) e Thomas Ruyant (Linked Out) diminui a cada atualização da posição dos barcos. Ele não está sozinho. Poucas milhas atrás, vem Louis Burton (Bureau Vallée 2), este já comentado por mim anteriormente. Sem acontecer novas quebras, creio que a vitória na Vendée Globe 2020-21 estará entre estes cinco concorrentes.

O Groupe Apicil está atualmente velejando em ventos brandos e seu skipper prepara-se para tentar contornar uma pequena área de alta pressão ao norte: “Eu estou bem, de fato muito bem, navegando com vento favorável e um mar bem mais calmo que no Pacífico. Agora, é hora de subir o Atlântico, evitando, se possível, o pior da área da atual alta pressão à frente. E outras estarão barrando o caminho até o equador. Estamos como que entrando num jogo de gato e rato com a Natureza”.

E conclui o pensamento: “O Charlie Dalin e o Thomas Ruyant não estão tão longe assim...

Esta foto do Apivia foi realizada hoje por helicóptero das Forças Armadas inglesas estacionadas nas ilhas Falkland (Malvinas)

Esta foto do Apivia foi realizada hoje por helicóptero das Forças Armadas inglesas estacionadas nas ilhas Falkland (Malvinas)

Segundo Damien, o momento não deve estar sendo nada fácil para Yannick Bestaven: “Pode ser bom estar na frente, principalmente quando se pega carona com um sistema de baixa pressão como aconteceu nas altas latitudes. Mas agora, na subida do Atlântico, não me parece ser muito bom. Principalmente porque você será o primeiro a ser pego numa alta pressão, terá o desempenho diminuído e verá os perseguidores se aproximando rapidamente”.

O skipper do Groupe Apicil conta como é seu estilo de competir: “Eu tiro curtas cochiladas de uma hora. O alarme de meu despertador toca e vou então inspecionar o barco. Verifico o rumo, velocidade, todos os ajustes das velas e programação. Quando escurece, procuro descansar o máximo possível, pois durante a noite é quando o corpo humano pede descanso. Tento conseguir cinco a seis horas de sono a cada 24 horas, desde o início da regata. O curioso: não tenho sonhado quando durmo fracionado assim, acredito que não é possível atingir o modo REM, que traz os sonhos. Nunca pude sonhar nesta Vendée Globe. Nem sobre minha casa e uma boa pizza!

Damien, contudo, não está preocupado com escassez de mantimentos, como ocorre com Charlie Dalin, que partiu com o Apicil abastecido para apenas 80 dias: “A Vendée Globe 2020-21 está sendo muito lenta, mas eu parti prevendo 90 dias para minha volta ao mundo. Assim, ainda tenho o suficiente. Contudo, já enjoei de alguns pratos. Gostaria de ter frutas e vegetais, fazem falta, mas em compensação tenho ainda um pouco de queijo beaufort, ganhei de presente de um professor que veio me visitar a bordo”.

Nascido em 3 de setembro de 1979, sem a mão esquerda, Damien Seguin tornou-se um velejador profissional sem se limitar por isso. Ganhou três medalhas de ouro nos jogos paraolímpicos, inclusive no Rio de Janeiro em 2016, e cinco campeonatos mundiais na classe 2.4 mR.

Sua vida na vela sempre foi caracterizada por convencer a terceiros de que podia superar sua limitação física, não apenas argumentando, mas principalmente vencendo. Este skipper francês começou  sua carreira de velejador em 2005, competindo na classe Figaro. Depois, passou para a classe 40, disputando duas Rotas do Rhum (tradicional regata oceânica francesa) com bons resultados. Planejar uma navegação de volta ao mundo em solitário foi uma evolução natural.

O Groupe Apicil é um veleiro projetado pela Finot-Conq e foi a grande estrela de En Solitaire, filme francês sobre a Vendée Globe. Damien Seguin sentiu-se atraído por este veleiro Imoca (International Monohull Open Class Association, Associação Internacional de Classe Aberta de Monocascos) não pelas qualidades fotogênicas dele, mas pela sua simplicidade e robustez. Procurou os conselhos de Jean Le Cam, que o ajudou a preparar-se para a Vendée Globe e o orientou com sua experiência pessoal em circum-navegação. Agora, em plena regata, está à frente inclusive de seu mestre Jean Le Cam, demonstrando que, com força de vontade e inteligência, projetos audaciosos podem dar certo.

O Groupe Apicil, um Imoca lançado em 2008 e sem hidrofólios

O Groupe Apicil, um Imoca lançado em 2008 e sem hidrofólios

Características básicas do Groupe Apicil

Nomes anteriores: Comme Un Seul Homme, DCNS
Projeto: Groupe Finot-Conq
Lançamento: 10 de agosto de 2008
Comprimento: 18,28 m
Boca: 8,85 m
Deslocamento: 8,5 t
Altura do mastro: 29 m
Área vélica (contravento): 350 m²
Área vélica (popa): 610m²
Hidrofólios: ausentes