Vendée Globe Real e Virtual – 17-1-2021
A Regata de 1 milhão
de veleiros virtuais
Skipper francês vence a maior simulação de regata já realizada
A versão virtual da Vendée Globe 2020-21, promovida pelo site Virtual Regatta com o apoio da organização da Vendée Globe, foi a mais disputada, e em alto nível, já realizada. Ao registrar o barco MinutoNautico virtual para participar da mais difícil regata de circum-navegação do mundo, eu não imaginava que a disputa chegaria a ter praticamente 1 milhão de inscritos (parece que não chegou a esse número por pouco). Isso com a participação dos maiores nomes da vela oceânica europeia, como vencedores até da própria Vendée Globe real (François Gabart, Armel Le Cléac’h e outros consagrados como Loïck Peyron. Tampouco que dezenas de milhares dos participantes amadores alcançassem tão alto nível.
Ao final, a vitória foi de um praticante de regatas virtuais pouco conhecido, o francês Jean Claude Goudon, com o barco tigrou26120. Ele, com certeza, escolheu o rumo certo na hora certa, pois, como diz um amigo, regatas virtuais são feitas para serem vencidas como muita dedicação, técnica, competência e, principalmente, sorte. Mas sem as qualidades anteriores, a sorte não ajudaria em nada.
Já o ganhador do relógio Diver X Nemo, da marca Ulysse Nardin, cronometrista oficial da Vendée Globe, no valor de 8.900 libras esterlinas (63.991 reais no cambio oficial de hoje), foi o francês Rafal71-TPN. Esse prêmio foi destinado ao primeiro competidor a passar pelo Ponto Nemo (escrevi a respeito desse local na postagem de 28 de dezembro). Os franceses formaram o maior número de participantes entre os inscritos de 135 países.
Entre os brasileiros, a vitória foi do caulimaran – BST, da equipe Brazilian Sailing Team (BST). da qual também faço parte com meu barco pessoal, o Ondazul-BST.
Reais e virtuais juntos
Durante toda a realização da regata, eram tantos barcos, que foi impossível confiar no sistema de classificação da regata. Este leva em conta a distância do veleiro para a linha de chegada. Mas barcos não correm como carros, numa pista delimitada; assim, até pouco antes de cruzar a linha de chegada, ninguém sabia realmente quem estaria ou não verdadeiramente na liderança.
Vou explicar melhor aos amigos que não conhecem. Se você está a 500 milhas do destino, tem duas opções: tentar navegar em linha reta (o que em 99% das vezes corresponde a suicidar seu barco como aqueles bichinhos lemmings saltando de um rochedo sobre o mar) ou seguir os ventos no intrincado percurso em que lhe oferecem vencer seguindo o caminho mais longo, mas com a maior velocidade em termos do desempenho final.
Para isso, você terá de estar acordado, sempre, a cada seis horas, para verificar a entrada dos novos ventos obtidos pelos satélites da National Oceanic and Atmospheric Administration (NOOA), dos EUA, que são incorporadas na interface da regata virtual. Assim, você terá de navegar com os mesmos dados meteorológicos com os quais os velejadores reais estarão lidando no mundo real. Isso exige estudos de modelos atmosféricos, uso de programas de computadores para roteamento (seus cálculos sugerem a melhor rota para chegar ao destino dado no tempo escolhido), marcação dos barcos próximos ou mesmo distantes estudando as opções dos rivais, conhecer os polares (dados de desempenho do veleiro conforme a vela que estiver usando) e mais pequenos detalhes para observar e analisar antes de chegar a uma conclusão. A análise de todos os dados pode demorar até uma hora a cada vez que chegam as previsões. E continua a vigília para evitar surpresas.
Assim, uma navegação virtual exige, em termos de estudos e esforços para se manter acordado, um grande e contínuo esforço. Ninguém deixa de perder tempo de sono quando participa de um desafio destes. Imagine os skippers (navegadores) em seus barcos reais, que além dos cálculos para definição de rota ainda precisam trocar realmente as velas, fazer regulagens em todos os equipamentos, consertar peças que quebram (quando for possível), preparar refeições, entrar em contato com a imprensa e organização pelo rádio de bordo etc. E estão lá fora, lidando com tempestades, ondas de cinco, dez metros e ventos furiosos de 40, 50, 60 nós de velocidade (80, 100, 120 km/h).
Felizmente, para um skipper virtual não há esse lado sofrido e assustador. Ele apenas senta na poltrona e fica quebrando a cabeça para definir o melhor caminho no sentido de uma vitória. Em compensação, se no mundo real partiram 35 participantes, no virtual você está disputando com praticamente um milhão de pessoas.
Participação do MinutoNautico
Minha participação, posso resumir como discreta. Para mim, estar competindo na Vendée Globe virtual era não apenas estar disputando um jogo e desafio altamente complexo, mas também um trabalho profissional — não tem melhor modo de acompanhar um grande evento do iatismo mundial que estar junto na versão virtual (que é totalmente interligada com a real). Só assim para contar aos meus leitores o que acontecia no dia a dia quanto ao posicionamento dos barcos reais. Suas táticas e manobras são facilmente identificadas, porque os veleiros reais e virtuais estão plotados no mesmo mapa, e suas ações podem ser acompanhadas em tempo real.
Assim, fui obrigado a me superar, principalmente quanto ao cansaço. Fiz o que pude, com foco em meu objetivo: contar aos visitantes do site Minuto Náutico tudo o que ocorreu na Vendée Globe 2020-21 real, e ainda um pouco da virtual, que terminou ontem pela manhã para o meu barco MinutoNautico, na 2.205ª posição.
Para finalizar, quero agradecer a inúmeros leitores deste site, que nos acompanharam e até mesmo incentivaram com comentários e troca de informações de valor inestimável para que eu pudesse aprimorar mais e mais meu trabalho. Quero agradecer, na verdade, a todos vocês que estão acompanhando, e também anotar a minha boa surpresa de ter tantos portugueses extremamente motivados ao meu lado e do nosso site brasileiro Minuto Náutico (Tomás Silva, Eduardo Wallestein e outros novos amigos brasieiros, como o entusiasmado Emanuel Cortez, que se inscreveu na hora em que soube do desafio).
Momentos da regata e a classificação final geral e de brasileiros (foi maravilhoso terminar em 8º lugar entre os brasileiros, parabéns principalmente ao Francisco Hopcker pelo segundo lugar!). Uma constatação, como vocês podem ver pelas fotos: este não é um game para crianças e adolescentes… (rs)