Vela real e virtual

screen.jpg

Regatas reais e virtuais,

de mãos dadas!

Por Roberto Negraes*

Você já pensou em se tornar um grande campeão internacional de iatismo, reconhecido em todo o mundo, confortavelmente sentado no sofá de sua casa, em frente ao computador? Não, não ria, é coisa séria, e muito séria!

Competir em regatas internacionais sem precisar nem ao menos possuir um veleiro não só é possível como também oficializado pela entidade máxima da vela mundial, a WS (World Sailing)! O mundo mudou muito com a tecnologia digital, todos sabemos disso. E a tecnologia evolui a cada hora, dia, ano, de um modo inacreditável para muitos, difícil de acompanhar. Em certos setores, como do esporte da vela, a evolução tornou-se tão grande, o desenvolvimento tão sofisticado, que atualmente não existe nenhuma grande regata internacional, tal como a Volvo Ocean Race (atual The Ocean Race) ou a Vendée Globe, sem sua versão virutal simultânea. Além disso, regatas triangulares, a exemplo de America's Cup e outras, se tornaram até oficiais pela entidade máxima do iatismo mundial, a WS (World Sailing), desde 2018, com o lançamento do eSailing World Championship.

Esta história de sucesso começou em 2006, quando o francês Philippe Guigné criou uma interface gráfica simulando um barco em regata para a tradicional regata Route du Rhum, regata em solitário que percorre uma rota de Saint Malo (França)a Point-à-Prite (ilha de Guadaloupe, no Caribe). O sucesso foi tão grande que em 2008-2009 foi a vez da Volvo Ocean Race ter sua versão virtual concomitantemente à real. Em seguida, a Vendée Globe, com centenas de milhares de participantes de mais de 130 países! O sucesso foi tão grande que hoje estão registrados mais de um milhão de praticantes de vela virtual. Entre eles, muitos velejadores que competem em campeonatos nacionais e internacionais se interessaram e estão presentes também nas virtuais.

Abaixo, página da Virtual Regatta com opções de regatas para participar (copiada hoje, 7 de dezembro de 2019). Sempre tem seis, sete ou mais regatas disponíveis. Reparem no número de participantes por regatas, e o total de barcos disputando no momento. Quando das regatas maiores, Volvo Ocean Race, Vendée Globe e outras, chegam a 1 milhão.

2019-12-07 at 11.57.51.jpeg

Uma regata virtual não é simplesmente um game. É uma simulação que obedece a fatores tão reais que logo em 2011 a federação francesa de iatismo homologou o site Virtual Regatta como um clube náutico. Daí a reconhecerem os praticantes que demonstram bom desempenho com habilitação náutica (dispensando de exames para obter a carta) foi um passo. E a novidade é que agora a WS homologou as regatas virtuais do tipo inshore como evento internacional de iatismo. Foi criando assim o eSailing World Championship em 2018. Recentemente, o torneio de 2019, depois de várias fases seletivas disputadas por dezenas de milhares de praticantes, teve a decisão final nas ilhas Bahamas, com a vitória do italiano Filippo Lanfranchi (atual campeão mundial de eSailing 2019). Parece que logo poderemos ter igualmente um campeonato mundial oficial pela WS de regatas offshore, contando pontos na participação das principais regatas internacionais homologadas pela entidade.

Video da cobertura da eSailing World Championship 2019 (Assistam, é extremamente interessante):

Mas como são essas regatas e por que velejadores tradicionais se interessam e participam? A resposta é simples. Como um veleiro de regata tem toda a medição matemática (áreas vélicas, perfis do casco etc.), passar os dados do barco para o computador criando um modelo virtual perfeito não é tarefa difícil para programadores. Além disso, o sistema meteorológico da NOOA (National Oceanic and Atmospheric Administration), nos EUA, com seus satélites que cobrem todo o planeta, levantam os dados meteorológicos em tempo real de qualquer área do planeta e a disponibilizam para download imediato. Portanto, na interface você tem um barco real, com todas as velas e desempenho medidos, e os ventos dinâmicos fornecidos pela NOOA (estão em constante movimentação, mudando até de minuto em minuto, obedecendo aos parâmetros reais que ocorrem na região onde o veleiro está navegando), o comandante precisa determinar a melhor rota pela carta marítima oferecida pela interface. Cada regata utiliza os veleiros correspondentes à regata real, por exemplo, se é a Volvo Ocean Race, você comandará um veleiro da Volvo oficial com todos os dados disponibilizados na tela e ventos em tempo real.

Com isso, as regatas são para pessoas com conhecimento de táticas de regatas oceânicas, conhecimento de meteorologia (precisa pensar na evolução das previsões para dali a sete dias ou mais), já que a velocidade do barco virtual é a mesma do veleiro real. Assim, uma regata dura o mesmo tempo; no caso de pernas longas, você terá de navegar durante vinte, trinta dias ou mais, de sua casa.

Numa regata com 300 mil participantes ou mais, muitos deles consagrados velejadores e experientes marinheiros, sem dúvida não é fácil conseguir um bom resultado. O que torna apaixonante e até viciante participar destas disputas. Quer competir?

Imagem do meu barco Ondazul disputando uma regata atual (apenas treinando, barco sem opções extras, faltando velas e equipamentos para melhor desempenho):

2019-12-07 at 11.57.50.jpeg

 

Nosso velejador virtual

 
Foto: Arquivo pessoal

Foto: Arquivo pessoal

 

*Roberto Negraes é jornalista especializado em náutica e navegação, um dos pioneiros do setor. Em sua primeira participação numa regata virtual, conseguiu um 8º lugar numa das etapas da Volvo Ocean Race de 2008-09. Depois disso, passou a praticar e tornou-se o melhor brasileiro e participante do continente americano durante anos, vencendo etapas de regatas internacionais como a Velux Five Oceans em 2010, vencendo na categoria SO (sem equipamentos extras) uma Solitaire du Figaro, 2º lugar na Cap-Istambul de 2010, e terminando entre os Top 10 em 16 grandes eventos internacionais. Na Volvo Ocean Race de 2011-12, esteve em 2º lugar até a sexta etapa, infelizmente não deu sorte nas duas últimas pernas e finalizou em 5º lugar entre 330 mil participantes de 184 países. Depois disso, parou de competir desde 2012, mas retornou agora às regatas virtuais, participando inicialmente de regatas como testes, para adaptar-se (a tecnologia desenvolveu-se muito nos últimos anos).