Cape2Rio 2020 real e virtual
Assistindo e competindo
Por Roberto Negraes*
A regata Cape2Rio 2020 teve duas largadas, e o nosso velejador virtual, que participou de ambas, com dois barcos, conta o dia a dia da competição na tela do computador e no mundo real
Este é o relato, resumido, do dia a dia acompanhando a regata Cape2Rio 2020, travessia do Atlântico Sul entre a Cidade do Cabo (Cape Town, África do Sul) e o Rio de Janeiro, realizada neste mês de janeiro. Acompanhei o evento e paralelamente participei da versão virtual, o que traz uma boa visão do dia a dia dos navegadores do mundo real. (ATENÇÃO: estou atualizando as notícias sobre o término da regata real ao final do texto, para não ficar repetitivo no diário de bordo da primeira e segunda largadas.)
Primeira largada, dia 4 de janeiro
4/jan./2020 - Às 9 horas da manhã (horário de Brasília), larga o primeiro grupo de veleiros da Cape2Rio 2020, formado pelos monotipos e alguns multicascos mais lentos (no total, 22 barcos participantes). Ao mesmo tempo, é dada a largada para a versão virtual, batizada como Cape2Rio Start 1, com cerca de 34 mil inscritos. Sou um deles, com o meu barco virtual Ondazul levemente equipado (apenas acrescentei catracas profissionais e a Code 0 às velas padrão que já vêm com o barco, a jib e a spinnaker, deixando de lado dois jogos de velas leves e pesadas). Os ventos são fracos desde o início (11 nós), enfraquecendo ainda mais nas 24 horas seguintes (apenas 8 nós) e variando de direção. Com isso, preciso estar atento pelo menos a cada meia hora, para corrigir rumos e velas (imagino o mesmo trabalho, porém físico, na regata real). Largo bem, mas poucas horas mais tarde, como de hábito, acaba a energia elétrica aqui no sítio. São seis horas com o barco abandonado justamente num momento fundamental — as primeiras horas após o início da regata. Enfim, ao voltar a energia, continuo, mesmo tendo perdido 3 mil posições com o problema (havia largado bem e estava entre os 300 primeiros colocados).
A maior parte da frota virtual segue num rumo noroeste, enquanto a frota real (que aparece junto com a virtual na interface do game), sobe para o norte. É a rota clássica para velejar da África do Sul para o Brasil. A ideia é ganhar altura, ajudados pela corrente de Benguela, e procurar ventos mais favoráveis para oeste (os alísios). Na página oficial da regata, dizem que o principal motivo é evitar os ventos fortes das altas latitudes, por segurança. O veleiro em destaque até agora é o Sulanga, um catamarã de 48 pés da Austrália. Vamos ver como cada flotilha vai se sair.
6/jan. - Sempre ventos fracos, de 8 nós em média, oscilando um pouco na direção, mas vindo de sul (tanto na real como na virtual). Recuperei bastante, e a classificação do Ondazul nesta manhã é a 857ª colocação, numa regata de 34 mil participantes. Com poucos recursos no barco e já 12 horas sem acesso por falta de energia elétrica, não está ruim. Parece ser realmente impossível para mim competir com qualidade. De qualquer modo, o Ondazul está na latitude 32 graus Sul, e as previsões mostram ventos cada vez mais fracos. Agora está a 10 nós, mas nas próximas 48 horas teremos de passar por uma região em calmaria, com ventos entre 6 e 2 nós! Somente depois disso, descendo para os 35 graus Sul, teremos condições melhores.
A regata real continua seguindo na tradicional rota norte, igualmente com pouco vento. O australiano Sulanga continua em primeiro lugar (sem levar em conta o handicap), enquanto o San Salvador (Argentina) e o Northern Light (África do Sul) resolveram navegar para noroeste (estão, respectivamente, em 2º e 4º lugares). Como curiosidade, enquanto o Sulanga veleja em ventos de 4 nós, meu Ondazul já está com 18 nós de ventos, em 34 graus Sul. E parece que teremos ventos bons e a favor a partir de hoje (dia 7).
8/jan. - Como previsto, chegando em 35 graus Sul, vêm ventos bem melhores. Aos poucos, o Ondazul recupera-se, chegando a estar em 257º lugar. E então... acaba a energia elétrica aqui em casa às 23h. Isso, pouco antes da atualização dos ventos pela NOAA (fico sem saber sequer para onde ir). A energia só retorna no dia seguinte às 11h. Encontro o Ondazul com vela e rumo errados (a flotilha virtual já está longe, ao norte), e por volta da 5.400ª posição do ranking! Enfim, volto a proa para oeste, vela correta e me pergunto o que fazer.
Na regata real, os barcos continuam perto da costa da África. O Sulanga agora tem um adversário bem próximo, o CiaoBella (barco sul-africano). Estão na altura dos 23 graus Sul. O San Salvador continua insistindo em ir para noroeste, mas com bem menos entusiasmo, vai ficando para trás. Outro veleiro indo bem é o Mojie 1 (monocasco sul-africano).
11/jan. - Finalmente, o australiano Sulanga, agora com boa vantagem sobre os demais, abre rota para oeste, na latitude de 23 graus. Praticamente todos os barcos fazem o mesmo, o que muda a classificação temporária. Depois do Sulanga, vêm o Umoya, o Mojie 1, o Argonaut (todos sul-africanos) e o argentino San Salvador. Os brasileiros Mussulo 40 Team Angola Cables e Saravah mantêm posições intermediárias por enquanto.
O Ondazul continua em ventos muito fracos, de 5 nós. Não lembro de nenhuma regata oceânica tão lenta quanto esta! Viajar da América do Sul para a África é rápido, basta descer nos 40 graus Sul. Mas para voltar é complicado, pelo sistema de alta pressão que se mantém no Atlântico Sul.
Continuo lutando, tentando recuperar as posições perdidas em razão das falhas constantes no fornecimento de energia elétrica aqui onde moro. Hoje, o Ondazul apareceu de manhã em na 1.500ª posição, e os ventos, apesar de fracos, estão ajudando um pouco pela minha escolha de rumo. Neste sétimo dia, às 8 h, totalizamos 1.353,7 milhas percorridas, na posição 34°17'59"S e 005°02'20"W. Ainda faltam 2.106,1 milhas para o Rio de Janeiro!
12/jan. - Pouco a acrescentar. Surgiram ventos razoáveis, mas de proa. Tive de orçar, poucas vezes superando os 7 nós de velocidade durante 24 horas. O Ondazul, como eu imaginava, com os problemas que tive pela falta de energia, não conseguiu nenhum avanço no ranking, será quase impossível terminar entre os mil primeiros. Mas vou continuar tentando.
13/jan. - Finalmente, um dia mais agitado, com ventos (de proa, claro), entre 20 e 25 nós. Em vento de 23 nós, em TWA (ângulo de vento em navegação) de 60 graus, o Ondazul (veleiro da classe 40, escolhida pela organização da regata virtual para todos os competidores) navega a 10,4 nós.
Na regata real, o catamarã australiano Sulanga aparece como o barco com mais chances no momento. Os veleiros reais subiram muito para o norte e finalmente viraram para oeste. A maioria nos 21 graus Sul, uns poucos nos 22 graus Sul. Depois dele, aparecem os sul-africanos Mojie 1, CiaoBella e Umoya em 2º, 3º e 4º, respectivamente (falo da classificação provisória sem contar handicap do grupo que largou dia 4 de janeiro).
15/jan. - Os primeiros colocados da Cape2Rio oficial passam hoje ao sul da ilha de Santa Helena, com uma brisa leve, iniciando a descida para sudoeste em direção ao Rio de Janeiro. Os velozes maxitrimarãs, da segunda largada, dia 11, já ultrapassaram os líderes da flotilha da primeira largada, dia 4 de janeiro. O líder do grupo do dia 4 continua sendo o Sulanga, com o CiaoBella e o Mojie 1 na perseguição direta (são os três primeiros atuais na geral, em handicap os brasileiros começam a se destacar).
Na virtual, consegui que o Ondazul recuperasse 300 posições, agora próximo de entrar nos top 1.000. Tarefa difícil, mas vamos em frente. Com as variações constantes da direção e velocidade dos ventos (fracos), até agora não é possível definir um favorito para esta regata no modo virtual.
16/jan. - Enquanto isso, o catamarã Sulanga, que liderou desde a primeira largada até os maxitrimarãs Maserati e Love Water partirem dias depois e já o deixarem para trás, continua indo bem e em terceiro da categoria multicascos. O duo Ciao Bella e Umoya continua numa disputa apertada. Mais ao sul, entre os monocascos, o brasileiro Mussulo 40 Team Angola Cables está ao norte de toda a flotilha, indo muito bem e ganhando posições, com o sul-africano Ballyhoo Too próximo.
Consegui uma recuperação incrível esta noite. O Ondazul agora, apesar da grande desvantagem em equipamento, ganhou mais 300 posições. Agora em 855 no ranking! Um pouco de sorte ajudou quando decidi subir para o norte, deixando o rumo geral de flotilha. Mas nem sempre é fácil manter. Vamos ver como os ventos irão se comportar nos próximos dias.
18/jan. - O Ondazul passou para o 810º lugar. Começo a ter esperanças reais de conseguir um lugar entre os mil primeiros. Isso anima, depois daquele desastre no início da regata, quando faltou energia em casa por 24 horas (no total) em apenas quatro dias, sem poder navegar pela internet.
19/jan. – O australiano Sulanga continua comandando os veleiros da largada do dia 4, porém o Myrtle of Bonnievale (África do Sul) já o ultrapassou no handicap entre os multicascos, talvez por estar muito ao norte, em minha opinião. O Umoya, mais ao Sul, embora faltando mais milhas para o Rio de Janeiro, me parece estar avançando bem. Mas Ciao Bella e Mojie 1 são os barcos mais próximos do Sulanga. E o brasileiro Mussulo 40, pelo handicap, assume a liderança geral dos monocascos e também para tripulação de apenas duas pessoas!
Na virtual, bem mais adiantada (a rota mais ao sul de fato está melhor), o Ondazul continua entre os oitocentos melhores, com a 811ª posição no momento. Faltam 407 milhas marítimas para a linha de chegada, já percorridas 3.268,5 milhas, em 15 dias e nove horas. Creio que conseguirei ficar entre os mil primeiros.
20/jan. - O Sulanga destacou-se bastante durante esta noite, assim como o Ciao Bella. A dupla lidera o grupo no geral, mas não em handicap. O brasileiro Saravah também obteve ótimo desempenho esta noite, e está agora em segundo pelo handicap! O final desta regata, com as condições meteorológicas adversas, com muita variação de intensidade e direção dos ventos, promete.
21/jan. - Os primeiros veleiros virtuais da largada do dia 4 chegaram ao Rio de Janeiro nesta madrugada. O vencedor foi o australiano Black-Legend.TPN, finalizando em 16 dias e 21 horas o trajeto (barcos classe 40). Em segundo e terceiro lugares, os franceses JohnBourner e nicobaiona; depois um canadense, Gonavy 1326 e em quinto outro francês, ghostbuster TPN. O Ondazul deve chegar esta noite.
Os veleiros do mundo real ainda estão muito longe, apesar das polares serem equivalentes. É que pelo sul, fora da rota tradicional, os ventos, embora em geral fracos, foram mais consistentes. O líder entre os catamarãs da Cape2Rio 2020, pelo handicap, é o Myrtle of Bonnievale, apesar do Sulanga estar muito à frente (e foi ultrapassado pelo Ciao Bella). Ainda pelo handicap, entre os monocascos, os dois brasileiros lideram, com o Mussulo 40 Team Angola Cables em primeiro lugar e o Saravah em segundo.
22/jan. – Na regata virtual, finalmente cruzo a linha de chegada, e para minha satisfação, termino na 740ª posição do ranking! Não acreditava que conseguisse uma recuperação destas depois de ter caído para mais de 5 mil na classificação pela falta de acesso à internet, mas as minhas escolhas deram certo. Muito esforço com noites maldormidas, e análises e análises de rumos, tanto olhando as previsões meteorológicas quanto observando as recomendações de roteadores. Agora é acompanhar os barcos reais até finalizarem a regata.
23/jan. - Surge uma grande preocupação para os veleiros da regata Cape2Rio 2020 (a real), que aos poucos se aproximam da costa brasileira, onde se formou uma rara tempestade subtropical, segundo a Marinha, alimentada por temperaturas atípicas da superfície do mar em até 26 graus centígrados. O fenômeno prevê ventos força 7 a 9 (aproximadamente entre 34 e 50 nós, com rajadas ainda mais fortes). Ondas de até seis metros de altura. Como se desloca para o sul, a organização na Cidade do Cabo recomenda à frota a se manter acima dos 20 graus de latitude Sul.
24/jan. - Pelas mensagens enviadas pelos veleiros da Cape2Rio 2020, é considerável a preocupação com o mau tempo. O Mojie 1 enviou a seguinte mensagem hoje, publicada no site da regata: “Na realidade, navegamos em ventos fracos desde nossa primeira noite fora da Cidade do Cabo, e passamos dez dias indo para o norte, à procura desses ventos alísios mais fortes. Quando finalmente chegamos a eles, reconhecidamente a navegação foi incrível, mas passamos muito tempo subindo para o norte para encontrar mais vento. Agora que o encontramos, temos de velejar ainda mais para o norte em busca de ventos mais fracos e evitar a tempestade subtropical Kurumi em nosso caminho? O que aconteceu com o previsto fácil acesso ao Rio de Janeiro? Tais são os caprichos da vela no mar!”.
Segunda largada, dia 11 de janeiro
11/jan./2020 - A segunda largada da Cape2Rio 2020, voltada para multicascos e veleiros de regata, foi com ventos fracos, como na do dia 4 passado. Começou com 10 nós, e uma hora mais tarde estava em 11,5 nós. O meu barco, nesta versão, é um Multi 50, e chama-se Curupira. Uma hora depois do início do evento, navegava a 14,1 nós. Com certeza, a navegação será menos monótona.
Retiro o que disse. De noite, o vento já caiu para 6 ou 7 nós, e diminuindo.
Veleiros virtuais inscritos são mais de 24 mil, enquanto os barcos oficiais são apenas 22. Na largada de hoje, dos veleiros de regata (os big dogs, na expressão inglesa), dois trimarãs praticamente voaram baixo e deixaram todos os demais na esteira: o italiano Maserati, um máxi de 70 pés, e o sul-africano Love Water, de 80 pés. Agora, às 21h40, ambos estavam navegando a quase 30 nós, e já estão a mais de 160 milhas da Cidade do Cabo!
12/jan. - Esta é a regata das calmarias (lembrando do Ondazul na regata iniciada dia 4). Os veleiros oficiais participantes da Cape2Rio 2020 sobem para o norte, aproveitando correntes favoráveis e melhores ventos, para somente depois dos 23 ou 24 graus, já na altura do Rio de Janeiro, rumarem para oeste. Alguns poucos virtuais ousaram seguir a rota dos barcos reais (veremos mais tarde, não deu certo essa estratégia). Hoje, o Curupira passou o dia e a noite em brisas de 3 a 5 nós!
13/jan. - Um dia ideal para pescar. A brisa está tão fraca como um sopro de velhinha tentando apagar a velinha. À tarde, melhora um pouco. E o Curupira ultrapassa os 10 nós de velocidade. Na madrugada, os ventos devem atingir de 15 a 20 nós de noroeste (o plano é descer mais para o sul em busca de ventos mais fortes. Estou a 33 graus Sul e descendo, junto com um grupo compacto de velejadores, entre eles o Francisco Höpker, recentemente entrevistado aqui no Minuto Náutico (do barco KikoPR BST).
Os veleiros reais da largada do dia 11, como os anteriores, sobem a costa para latitudes acima dos 24 graus. São nove os participantes, com os dois multicascos (Love Water e Maserati) realizando como uma regata exclusiva, deixando todo mundo longe, sempre navegando entre 24 e 30 nós de velocidade, mesmo em ventos de pouco mais de 10 nós. Já estão alcançando o grupo do dia 4, isso em apenas três dias. Dos veleiros monotipos, os destaques são os brasileiros Mussulo 40 Team Angola Cables e Saravah, o alemão Haspa Hamburg e o italiano Almagores II. Ao menos, estão velejando em ventos de 18 a 20 nós, ao contrário dos barcos virtuais limitados pela calmaria em que se meteram.
14/jan. - Navegação praticamente em rumo fixo o dia inteiro, ventos de 12 a 16 nós. O Curupira aparece no início da noite em 36º lugar, mas num posicionamento em desvantagem para o pessoal próximo. Devo perder posições até amanhã. Acordo às 2h30 e tenho uma grande surpresa. O vento mudou de novo e mais fraco. O KikoPR BST já está subindo novamente para noroeste, e faço o mesmo. Ele está com desempenho excelente, entre os cinco primeiros. Depois, desceremos novamente procurando vento. Definitivamente, velejar em ventos fracos resulta que ninguém pode dormir. As condições mudam rápido demais.
15/jan. - O duelo entre o Love Water e o Maserati está incrível. Lado a lado, já passaram por toda a frota virtual e deixaram os concorrentes reais muitas milhas distantes. O brasileiro Mussulo 40 -Team Angola Cables lidera neste grupo que largou dia 11 entre os monotipos. O italiano Almagores II muito próximo, enquanto o brasileiro Saravah optou por atravessar para oeste mais ao sul.
Na regata virtual, a turma do norte se destacou, deixando o grupo onde estou para trás. É que passamos a noite em ventos de 3 a 4 nós. Começa a melhorar ao meio-dia. O Curupira caiu para 370ª posição.
16/jan. - O brasileiro Mussulo continua como líder entre os monocascos, embora o Saravah tenha tido um bom desempenho nas últimas 24 horas. O Mussulo é o barco mais ao norte de toda frota no momento, e parece ter posição ideal para os ventos nas próximas 24 horas.
Entre os virtuais, o duelo entre o grupo ao norte e o grupo ao sul continua fantástico. Hoje, o Curupira está no 40º lugar, mas temos uma frente fria com ventos moderados, entre 20 e 22 nós. Os dois grupos se misturam na classificação. O líder do momento é o australiano Seadog, o barco mais ao norte de todos, navegando na mesma latitude da cidade do Rio de Janeiro.
O “mas” acima refere-se a um problema. Com ventos mais fortes, precisaria da heavy gennaker, porém não adquiri essa vela para a regata. Com isso, o Curupira desenvolve 0,4 nó a menos que os demais do grupo. Vou dormir pensando nisso, só que não consigo. Levanto e tomo uma decisão.
Como os ventos pouco mais para o norte estão mais fortes, mesmo com vela inferior posso fazer o Curupira mudar de 140 TWA para 135 (às vezes até 130 TWA) e desenvolver o suficiente para diminuir a diferença para apenas 0,1 nó. Ficar mais ao norte é um risco, mas pior é não fazer nada e perder de 6 a 8 milhas nas próximas 36 horas (depois das quais estão previstos ventos mais brandos, o que volta a igualar o Curupira aos demais). Com tantos barcos próximos, cairia talvez duas centenas de posições ou mais.
17/jan. - O duelo entre o Love Water e o Maserati continua empolgante, com os grandes trimarãs se alternando na liderança, e navegando muito próximos, entre 15 e 20 milhas!
Na regata virtual, hoje pela manhã tive uma surpresa. No modo 3D da interface, além dos adversários mais próximos, avistei o Maserati (muitas milhas à frente)! É assim que podemos acompanhar e velejar virtualmente junto com os barcos reais. Estão todos integrados na interface do game. Um clique no nome do barco e aparece a velocidade do vento e do barco, ângulo de vento em navegação (TWA) e outras informações em tempo real!
Em relação à estratégia por mim adotada, deu certo. Em vez de perder centenas de posições, o Curupira caiu apenas para a 99ª posição do ranking (cheguei a estar em 11º antes desse problema de falta de vela adequada). De nota, ontem o KikoPR BST assumiu a liderança da regata, embora o francês Machaon, seu concorrente direto, continue pressionando. A turma que escolheu a rota norte está descartada, ficou para trás.
18/jan. - A batalha entre o Love Water e o Maserati deve finalmente se definir. Parece incrível, já estão bem próximos do Rio de Janeiro (chegada prevista em dois dias), em apenas 1/3 do tempo tomado pelos demais participantes da regata. Uma covardia! (risos). Terão a honra de decidir quem será o primeiro a aportar no Iate Clube do Rio de Janeiro e vencer a Cape2Rio 2020.
Na virtual, o Curupira ocupa a 99ª posição hoje. Enfim, bem melhor do que ficar nove milhas atrás do grupo, pois se não tivesse adotado essa estratégia estaria em 300 ou mais! O KikoPR BST continua em duelo com o Machaon, mas infelizmente hoje o francês passou para a liderança. Nosso amigo brasileiro está em segundo, e com certeza não desistiu da vitória.
19/jan. - Os dois maxiveleiros chegam ao Rio de Janeiro. O desafio é vencido pelo Love Water, seguido de perto pelo Maserati. Os monotipos continuam com o Mussulo 40 - Team Angolan Cables em primeiro, mas ameaçado pelo Almagores II, que avançou muito nas últimas 48 horas. Seguem-se Haspa Hamburg, Zulu Girl e Saravah (este, bem posicionado, deve passar para segundo, estou na torcida), e em seguida os demais participantes.
Nos virtuais, a luta entre o KikoPR BST e o Machaon está lembrando a briga entre o Maserati e o Love Water. O Curupira, ainda em 99º lugar. Não é nada fácil voltar às melhores posições quando se perde uma rota lutando contra mais de 36 mil competidores. Mas vamos que vamos!
20/jan. - Finalmente destacam-se, já nas proximidades do Rio de Janeiro, os barcos Mussulo e Haspa Hamburg dos demais do grupo, mas no handicap, o Saravah já é segundo. Em regatas oceânicas, nada pode ser descartado. Ventos desencontrados, trechos em 10 a 20 nós, outros em calmaria total... Não está fácil para ninguém.
Com o Curupira, escolhi um rumo com bom resultado até o momento. Fui ganhando posições e agora, perto do meio-dia, o meu barco virtual aparece como 36º colocado! Atenção total neste final (deve terminar amanhã para os virtuais).
21/jan. - Os primeiros colocados de ambas as versões da Cape2Rio 2020 virtual chegam ao Rio. O Ondazul às 2h pela largada do dia 4 (em classe 40); e o Curupira, às 4h30 (largada dia 11 pela Multi 50). O Machaon venceu, superou o brasileiro KikoPR BST por pouco. Noite sem dormir, acompanhando e manobrando meus barcos para defender posições e tentar ganhar alguma. O Curupira termina em 35º lugar, mesmo sem contar com o chamado full pack, que engloba todos os recursos para o veleiro virtual. De qualquer modo, fiquei muito satisfeito com o resultado. Desde que voltei a competir, tenho apenas usado o padrão básico do barco, mais o que se pode comprar com o bônus de créditos gratuitos oferecidos pela Virtual Regatta. O Curupira acumulou créditos por bons resultados e assim pude equipar melhor o barco para a Cape2Rio 2020, faltando apenas a heavy gennaker (que fez falta). Parabéns ao KikoPR BST, um ótimo segundo lugar para o barco brasileiro, comandado pelo Francisco Höpker (BST é a sigla para Brazilian Sailing Team, equipe brasileira de ponta).
22/jan. - Uma tempestade a forma-se ao longo da costa brasileira e ameaça o final da regata real da Cape2Rio 2020. Parece ironia, já que nunca participei de uma regata virtual com ventos tão fracos e desfavoráveis.
23/jan. - Uma séria ameaça para os participantes reais da Cape2Rio 2020: surge um raro fenômeno meteorológico para o litoral brasileiro, uma tempestade subtropical, com ventos força 7 a 9, com rajadas (de 35 a 50 nós, ou 60 a 100 km/h) e ondas de até seis metros. Todos são obrigados a subir para o norte do Espírito Santo em latitude, pois a tempestade se desloca para o sul. Isso cria uma grande expectativa, pois como será a estratégia de cada um diante desta surpresa? O que parecia uma regata já definida torna-se uma grande dúvida no final. Abaixo, a classificação provisória até o dia de hoje:
Em classificação geral (sem contar handicap), pela ordem: Love Water, Maserati, Ciao Bella, Sulanga, Mojie 1, Haspa Hamburg, Umoya, Mussulo 40 Team Angola Cables, Argonaut e Almagores II
Monocascos, em classificação pelo handicap: Mussulo 40 Team Angola Cables, Saravah, Haspa Hamburg, Zulu Girl, Ballyhoo Too, Ciao Bella, Mojie 1, Anjo, Almagores II e Umoya.
Multicascos, em classificação por handicap: Love Water, Maserati, Myrtle of Bonnievale, Sulanga e Ronin.
Praticamente todos os concorrentes passaram ao norte da Ilha de Trindade, que fica na altura de Vitória (ES), para evitar a tempestade batizada como Kurumi. Tudo correndo bem, mas isso deve afetar a classificação. Vamos aguardar a flotilha superar o Kurumi para atualizarmos a classificação.
24/jan. - É notória a preocupação na Cidade do Cabo com a tempestade que atinge a costa brasileira. A prova disso é que no site do evento publicavam diariamente uma análise da regata, e deixaram de fazer isso desde que chegou a notícia da formação do Kurumi. Mensagem enviada hoje pela tripulação do barco brasileiro Saravah: “Os ventos têm variado muito hoje. Todos os veleiros estão agora se posicionando para o ponto mais baixo à frente. As estratégias diferem e, como resultado, os barcos estão espalhados por uma grande área do oceano. A baixa pressão agora não parece tão forte para os barcos que optam por atacá-la pela parte norte (inclusive nós). Estamos preparando barco e tripulação para o temporal, e esperamos que todos possam chegar em segurança ao Rio. A questão agora é: o que acontecerá a seguir? Grandes mudanças no vento são esperadas e podem ter um enorme impacto na posição final. Os GRIBs (previsões meteorológicas da NOAA) são aguardados, estudados e debatidos. A linha de chegada está se aproximando e as apostas estão aumentando”.
Enquanto as notícias sobre a tempestade subtropical Kurumi desaparecem de nossa imprensa, os veleiros que disputam a Cape2Rio 2020 começam a enfrentá-la na rota para o Rio de Janeiro. Cada barco reage de um modo: muitos diminuem a velocidade na esperança do Kurumi abrandar, outros decidem enfrentar a área afetada, onde os ventos estão chegando ainda aos 57 nós (pouco mais de 100/km); um veleiro menor procurou refúgio na Ilha de Trindade.
Não está nada fácil para os navegadores. O JM Busha é um dos que estão enfrentando o pior, seus tripulantes informam sobre ondas de seis metros em sequência, mais ventos extremamente fortes (força 8 e 9). "As notícias da equipe", relata o site da organização, “é de que tiveram uma noite difícil, com vela reduzida e grandes ondas. Bando duro esse time!"
"O Haspa Hamburg está hoje exatamente no meio da tempestade, com mar pesado. Parece querer se livrar o mais rápido possível do Kurumi, mas deve estar super desconfortável a vida a bordo", relata ainda o site oficial.
Mais ao norte, a dupla do classe 40 Mussulo 40, escolheu uma estratégia entre o Haspa e o JM Busha. O curso deste veleiro brasileiro vai mais para o sul, e deve enfrentar o pior da tempestade durante a luz do dia. O Sulanga, que procurou de modo conservador priorizar a segurança, deixou de ser o líder geral do grupo e foi o mais para o norte possível, até os 18 graus Sul, mas agora está descendo para o pior da tempestade. O Mojie 1 segue um rumo parecido com o JM Busha desde 21 horas passadas, e devem ter opções de escolha para enfrentar a tempestade de dia ou à noite. Atualmente, o Kurumi está se comportando como previsto pelos meteorologistas. E o restante da flotilha, que diminuiu propositalmente a velocidade, deve atrasar, mas encontrar condições mais amenas, com o Kurumi diminuindo de força. Atualmente, a tempestade está se deslocando e diminuindo como previsto e a flotilha mais atrás não deveria ter que lidar com condições tão extremas, pois eles fizeram um esforço sensato para navegar para o noroeste, a fim de evitar o pior. O Zulu Girl e o Almagores II, por exemplo, voltaram para o norte, desviando, aguardando momento melhor. Cada comandante toma sua decisão. A verdade é que a classificação, que vinha sendo estável desde a largada na Cidade do Cabo, sofrerá grandes mudanças neste final.
26/jan. - A tempestade subtropical Kurumi ainda não arrefeceu, continua sendo considerada "severa" e preocupando os responsáveis pela regata. Estão de alerta as Marinhas do Brasil e da África do Sul, em caso de necessidade de ajuda. A noite passada, o veleiro Zulu Girl enfrentou condições difíceis, mas parece já ter superado a área mais afetada pela tempestade, embora ainda esteja navegando sob ventos fortes, e logo deve tomar o rumo do Rio de Janeiro. A maioria dos barcos já conseguiu superar, com dificuldades, a tormenta, mas ainda restam três veleiros no caminho da tempestade, e foram emitidos alertas para todos eles de que irão passar por uma das áreas mais afetadas pelos ventos fortes e rajadas.
O Zulu Girl e os outros três barcos em área de risco (os nomes não foram revelados), estão sendo acompanhados de perto. Os organizadores pedem pensamentos positivos. Uma condição de mar igual a esta em águas brasileiras é raríssima, poucas vezes sucedeu algo assim.
Definitivamente, o Ciao Bella deve ser o primeiro veleiro do grupo a chegar ao Rio de Janeiro, após os "big dogs" Maserati e Love Water. E temos uma novidade na classificação entre os monocascos. Pelo handicap, o Saravah ultrapassou esta noite o Mussulo 40, na liderança da categoria. Ambos os barcos são brasileiros
27/jan. - Toda a flotilha da Cape2Rio 2020 já passou com sucesso, apesar de muito esforço e noites maldormidas (ou insones), pela tempestade Kurumi. Agora navegam com ventos calmos, e a chegada ao Rio de Janeiro é iminente. O site oficial da Cape2Rio 2020 cita que mais de 63 mil pessoas (e seus respectivos veleiros virtuais) participaram da versão da regata online, enquanto 163 navegadores estavam a bordo das 22 embarcações da prova real, e com certeza suportando um esforço incomum para superar tempestade, sofrendo com sol, chuva e mar agitado.
Falta muito pouco para os primeiros barcos chegarem ao Rio. O primeiro veleiro a entrar na baía da Guanabara deve ser o Ciao Bella (sul-africano), seguido provavelmente pelo Haspa Hamburg (alemão) e o Mussulo 40 - Team Angola Cables — este, brasileiro, em segundo lugar pelo handicap entre os monocascos; em primeiro está outro brasileiro, o Saravah.
28/jan. - Chegando ao Rio de Janeiro nesta madrugada, perto das 2 h, o Ciao Bella - JM BUSHA 54 Sailing Team, veleiro monocasco da África do Sul, conseguindo nas últimas milhas tomar a liderança dos brasileiros Saravah e Mussulo 40 Team Angola Cables, que ficaram, respectivamente, em 2º e 3º lugares entre os monocascos no momento da chegada do Ciao Bella. O segundo veleiro da categoria a chegar foi o alemão Haspa Hamburg, que com o handicap ficou em 4º lugar entre os monocascos. Os barcos brasileiros devem chegar no final da tarde. E, de fato, o Mussulo 40 conseguiu não apenas chegar, mas tomar o primeiro lugar de volta na categoria monocascos. Já é oficial, o vencedor entre os monocascos é o brasileiro Mussolo 40. Infelizmente, o Saravah ficou preso numa calmaria das teimosas e caiu de posição, indo para o 5º lugar. A vitória na regata Cape2Rio entre os multicascos foi do sul-africano Love Water, seguido do Maserati, ambos maxitrimarãs. Estes “big dogs” chegaram ao Rio no dia 17 passado, com o Love Water cruzando a linha de chegada em 7 dias e 20 horas. Entre os multicascos, ainda estão para chegar os sul-africanos Myrtle of Bonnievale, em 3º na categoria, e o Ronin, na 4ª posição. Por fim, o australiano Sulanga, 5º colocado entre os multicascos. A Cape2Rio 2020 é conhecida como "A Regata do Atlântico Sul", por ser a única disputada ao sul da linha do equador no Oceano Atlântico. A primeira vez em que foi realizada, em 1971, contou com 58 veleiros disputando o troféu. O primeiro vencedor foi o Ocean Spirit, depois de 23 dias e 42 minutos. Neste ano, a regata oficial teve 22 veleiros e, em paralelo, foi disputada em modo simulado (virtual), em parceria entre a organização do evento e o site Virtual Regatta, por mais de 63 mil participantes.
29/jan. - Mais barcos chegam ao Rio de Janeiro. Vejam como ficou a classificação até o momento — ainda faltam chegar alguns barcos, para confirmação do ranking definitivo, mas os primeiros lugares já estão certos. Os barcos em negrito já estão com as posições definidas.
Final da Cape2Rio 2020
1º/fev. - Diante de um público considerável e atencioso, segundo a organização, os competidores participaram das comemorações do centenário do Iate Clube do Rio de Janeiro, na sede do clube. Havia uma unanimidade entre os velejadores da Cape2Rio 2020: de todas as versões da regata de que participaram, esta foi a mais difícil, com sistemas meteorológicos complexos acontecendo ao longo do percurso, tornando a competição extremamente interessante.
Praticamente todos os veleiros da Cape2Rio 2020 chegaram ao Rio de Janeiro. Com isso, as classificações já estão praticamente completas, com os tempos corrigidos — e algumas surpresas.
A classificação dos dez primeiros entre os monotipos ficou assim (tempo corrigido):
1º Mussulo 40 Team Angola Cables (Brasil), com 23 dias, 8 horas e 55 minutos
2º Ballyhoo Too (África do Sul), com 23 dias, 14 horas e 7 minutos
3º Saravah (Brasil), com 23 dias, 18 horas e 17 minutos
4º Haspa Hamburg (Alemanha), com 23 dias, 19 horas e 31 minutos
5º CFM2 - Zulu Girl (África do Sul)¸ com 24 dias, 5 horas e 18 minutos
6º Ciao Bella (África do Sul), com 26 dias, 19 horas e 49 minutos
7º Mojie 1 (África do Sul), com 28 dias, 2 horas e 12 minutos
8º San Salvador (Argentina), com 28 dias, 10 horas e 33 minutos
9º Umoya (África do Sul), com 28 dias, 19 horas e 46 minutos
10º Anjo (Austrália). Este veleiro ainda não chegou e pode assumir a 7ª colocação se confirmar o desempenho até o momento.
O inesperado foi o Ballyhoo Too conseguir a 2ª colocação, com o brasileiro Saravah em terceiro lugar, depois de sofrer na calmaria próxima ao Rio de Janeiro. Tanto o Mussulo como o Ballyhoo Too tiveram apenas dois tripulantes a bordo. Será esta uma nova tendência para a grande regata do Atlântico Sul?
Mussulo 40
Este é o primeiro veleiro brasileiro a chegar na Cape2Rio 2020 e vencedor entre os monocascos
(Saiba mais sobre o Mussulo aqui.)
A classificação dos multicascos:
1º Love Water (África do Sul), com 11 dias 13 horas e 6 minutos
2º Maserati (Itália), com 11 dias, 14 horas e 52 minutos
3º Myrtle of Bonnievale (África do Sul), com 13 dias, 2 horas e 41 minutos
4º Ronin (África do Sul), com 15 dias, 0 hora e 20 minutos
5º Sulanga (Austrália), com 16 dias, 10 horas e 54 minutos.
Chegada dos veleiros da Cape2Rio 2020 ao Rio de Janeiro
Para mais informações da regata oficial, visite o site da Cape2Rio (cape2rio2020.com)
Nosso velejador virtual
*Roberto Negraes é jornalista especializado em náutica e navegação, um dos pioneiros do setor. Em sua primeira participação numa regata virtual, conseguiu um 8º lugar numa das etapas da Volvo Ocean Race de 2008-09, além de 22º e 27º em outras etapas. Depois disso, passou a praticar e tornou-se o melhor brasileiro e melhor participante do continente americano durante anos, vencendo etapas de regatas internacionais como a Velux Five Oceans em 2010, vencendo na categoria SO (sem equipamentos extras) uma Solitaire du Figaro, conseguindo o 2º lugar na classificação geral da Cap-Istambul de 2010 (num final polêmico, com os próprios franceses lhe escrevendo que um bug do game havia lhe tirado a vitória), e terminando entre os Top 10 em 16 grandes eventos internacionais. Na Volvo Ocean Race de 2011-12, após vencer a regata experimental oferecida pela organização, esteve em 2º lugar na classificação geral até a sexta etapa, infelizmente não dando sorte nas duas últimas pernas e finalizando em 5º lugar entre 330 mil participantes de 184 países. Depois disso, parou de competir desde 2012, mas retornou agora às regatas virtuais, participando inicialmente de regatas como testes, para adaptar-se (a tecnologia desenvolveu-se muito nos últimos anos).