Vendée Globe Real e Virtual - 1-12-2020

A bordo, são e salvo: Escoffier (ao fundo), enquanto Le Cam faz transmissão de vídeo após o resgate

A bordo, são e salvo: Escoffier (ao fundo), enquanto Le Cam faz transmissão de vídeo após o resgate

Naufrágio na vendée Globe

como Jean Le Cam salvou Kevin Escoffier

Foram momentos de grande tensão e ansiedade por todos os envolvidos na Vendée Globe 2020-21. E de grande alívio quando finalmente Le Cam e Escoffier apareceram juntos na transmissão de video do Yes We Cam

"Você vê imagens de naufrágios?”, perguntou Kevin Escoffier depois de resgatado. “Foi assim, mas pior. Em quatro segundos, o barco dobrou o nariz, a proa mergulhou a 90 graus. Eu coloquei minha cabeça no cockpit, vi onda chegando. Tive tempo de enviar um texto antes da água do mar fritar a eletrônica de bordo. Uma loucura total. A onda dobrou o barco em dois. Já vi muita coisa antes, mas esta aqui..."

Após onze horas e meia em sua balsa salva-vidas desde que foi forçado a abandonar seu veleiro Imoca 60 PRB sob ventos fortes e grandes ondas a 840 milhas a sudoeste da Cidade do Cabo, o skipper Kevin Escoffier foi dramaticamente resgatado por outro concorrente nesta Vendée Globe, Jean Le Cam, por volta das 1h18 UTC na madrugada desta terça-feira.

Escoffier estava em terceiro lugar no vigésimo segundo dia da regata de volta ao mundo, navegando com ventos de sudoeste entre 25 e 30 nós e ondas de 5 metros quando seu barco mergulhou em uma onda e, segundo relatou após seu resgate, literalmente quebrou o PRB em dois, dando-lhe poucos minutos para pegar seu traje de sobrevivência e embarcar na balsa de abandono.

O sinal de socorro de emergência (epirb) de seu barco foi ativado automaticamente e  transmitido ao serviço Cross Griz Nez da África do Sul, que imediatamente alertou a direção de regata da Vendée Globe em Les Sables d'Olonne.

Ao mesmo tempo, Escoffier, 40 anos, de Saint-Malo, um navegador experiente nos mares do sul, vencedor da Volvo Ocean Race e recordista de velocidade no Troféu Jules Verne, chamou sua equipe técnica com a mensagem "Preciso de assistência! Estou afundando. Isto não é uma brincadeira".

A direção de regata chamou Jean Le Cam, o navegador mais próximo da posição do PRB, para desviar seu percurso imediatamente para a zona. O veterano, de 61 anos, que está em sua quinta Vendée Globe, chegou por volta das 16h15 UTC e localizou a balsa de Escoffier, estabelecendo contato visual e de voz, apesar dos ventos então de 35 nós.

Contudo, os repetidos esforços iniciais de Le Cam falharam e a direção de regata teve que ampliar a operação. Assim, por causa da escuridão da noite que chegava e das más condições do tempo e do mar, a direção de regata solicitou que três outros velejadores se desviassem para a zona de resgate: o alemão Boris Herrmann (Seaexplorer - Yacht Club de Monaco), Yannick Bestaven (Maître Coq IV) e Sébastien Simon (Arkéa Paprec).

Surpreendentemente, horas depois, quando Escoffier apareceu ao fundo de uma chamada de vídeo que Le Cam deixara aberta, foi que a direção de regata percebeu que ele havia sido resgatado.

Le Cam lembrou "Eu estava bem posicionado. E disse a ele que voltaria, que não havia necessidade de apressar as coisas". O Yes We Cam usava apenas a vela grande com dois rizes, com ventos entre 30 e 32 nós. Com o mar agitado, não era fácil manobrar. Voltei para o lugar onde o deixei, mas não havia ninguém lá".

Le Cam relatou esta manhã cedo: "Procurei por ele cinco ou seis vezes, o que significa que tive que cambar cinco ou seis vezes por causa dos percalços que aconteciam o tempo todo, o estado do mar e assim por diante, acabei voltando para trás e perdi-o de vista".

Como foi organizado o resgate

A direção da Vendée Globe elaborou um protocolo de busca utilizando o programa de previsão de deriva Mothy (Modèle Océanique de Transport d'Hydrocarbures), do serviço de meteorologia Météo France, e colocou os três skippers requisitados em um padrão de busca triangular. Eles recebiam sinais intermitentes de socorro que pareciam não seguir nenhum padrão.

 O diretor de regata Jacques Caraës explicou: "Sempre tivemos um sinal. A única posição que estávamos obtendo era do sinalizador pessoal mob (homem ao mar), mas não sabíamos se ele estava ligado ao Kevin, pois parecia ser bastante aleatório, movendo-se muito de um lugar para outro. Em algum momento, pensamos em várias hipóteses, que o epirb poderia estar na balsa, com Kevin, à deriva na água ou preso ao veleiro. E, portanto, não foi fácil. Mas quando vimos a posição do epirb alinhada com a rota de predição de deriva, enviamos Jean para aquele ponto".

"Tínhamos organizado um padrão de busca triangular com Yannick Bestaven, que ia a sete milhas de distância; depois Boris mais perto e Sébastien mais perto". Eles percorreram sete milhas por 0,3 de milha em cada varredura, navegando com três rizes. Jean Le Cam recomendou isso porque era uma batalha. O vento estava caindo um pouco. Mas no início, quando Jean viu Kevin, o tempo estava ruim. Jean fez sete varreduras".

Caraës elogiou sua equipe e a colaboração das autoridades de resgate e Jean-Jacques Laurent, o CEO da PRB, patrocinador de longa data das entradas na Vendée Globe, que passou a noite na sede da regata, ajudando e apoiando a missão: "O resultado é quase um milagre. Não foi fácil pegar Kevin no meio da noite, Jean é um marinheiro extremamente experiente e sempre seguiu à risca nossas instruções. E tivemos a sorte de contarmos com especialistas ajudando de todos os lados, principalmente a Météo France com seu programa de simulação de deriva, que correspondia ao nosso rastreamento epirb. Mas tínhamos muitas incógnitas, muitas posições diferentes. Tínhamos que ser positivos o tempo todo e acreditar nas coisas. A sorte estava do nosso lado. É um resultado muito feliz e nós, da direção de regata, estamos muito felizes".

Jean Le Cam já foi salvo por um PRB

Este incrível resgate inverte os papéis desempenhados entre 5 e 6 de janeiro de 2009, durante a Vendée Globe 2008-2009. Vincent Riou, o então skipper do PRB, resgatou Jean Le Cam de uma capotada a 200 milhas a oeste do Cabo Horn. Le Cam ficou preso em seu barco virado por 16 horas, durante as quais não se sabia ao certo se estava seguro dentro de seu barco ou não.

Indagado esta manhã se ele ficou assustado ou preocupado durante o tempo em que passou na balsa salva-vidas, Escoffier respondeu: "Não. Assim que vi o Jean, tinha certeza que seria salvo".