A Classe Ultim
Os donos dos ventos
Por Roberto Negraes
Nas esteiras selvagens dos Ultim, borbulha o mar em respeito. São os maxitrimarãs de 100 pés, navegando acima dos 40 nós e até superando a barreira dos 50!
Agora o vento tem dono, os supertrimarãs de quase 100 pés de comprimento (32 m). E alguns até maiores, como o máxi Sails of Change, com 140 pés (42,6 m), construído com o objetivo único de bater recordes, principalmente o de volta ao mundo sem escalas (atualmente em poder do Ultim IDEC Sports, de Francis Joyon, estabelecido em 2017, em 40 dias, 23 horas, 30 minutos e 30 segundos). No momento, o Sails of Change aguarda no porto francês de Trinité-sur-Mer uma janela de boas condições meteorológicas para uma nova tentativa pelo Troféu Júlio Verne.
De fato, os maxitrimarãs surgiram exatamente com o objetivo de quebras de recordes. Até pouco tempo, os regulamentos das principais regatas oceânicas não previam a participação desses gigantes. Apenas o Troféu Julio Verne, um desafio de recorde de volta ao mundo sem escalas (que não traz praticamente nenhuma restrição ao tipo de veleiro a ser utilizado), era a única competição oficial da qual estes trimarãs participavam. Contudo, aos poucos, com o crescimento dessa flotilha, foi criada a classe Ultim. Com isto, os maxitrimarãs estão ganhando aos poucos o direito de participar das mais tradicionais regatas, assim como criam novos troféus para tentativas de recordes em rotas tradicionais dos clippers (veleiros rápidos para transporte de cargas) do século XIX.
Eles foram construídos para, literalmente, voar sobre as ondas dos mares do sul (utilizam hidrofólios), como se albatrozes fossem. O que explica as inimagináveis marcas até não muitos anos atrás, de inacreditáveis singraduras (distâncias percorridas em um período de 24 horas), como a obtida em 2009 pelo francês Banque Populaire V, com a média de 37,84 nós (70 km/h) ao percorrer 908 milhas marítimas, ou 1.681,6 km — os franceses dominam os maxitrimarãs, já que as regatas oceânicas são uma verdadeira mania nacional na França.
História dos trimarãs
Ao contrário do que muitos pensam, não foram os polinésios que inventaram os trimarãs. Os primeiros barcos de três cascos foram desenvolvidos no sudoeste da Ásia, como nas Filipinas (onde até hoje são usados por pescadores artesanais). Já os polinésios (e micronésios) também criaram barcos multicascos, mas os do tipo catamarã (com dois cascos).
Os veleiros multicascos, tanto catamarãs quanto trimarãs, começaram a ter sucesso no uso esportivo a partir dos anos 1960, mas os dois primeiros trimarãs conhecidos para uso recreativo foram construídos em 1943 por um ucraniano emigrado para os Estados Unidos, Victor Tchetchet, e mediam 24 pés (7,30 m).
Formada por diferentes trimarãs, a classe Ultim 32/23 (ou Ultime) teve origem por ocasião da regata Rota do Rum de 2010, quando os organizadores da competição decidiram separar os multicascos acima de 60 pés em uma categoria sem limite de tamanho. Desta forma, os maxitrimarãs já existentes (com cerca de 100 pés), como o Groupama 3 e o IDEC Sport, poderiam competir.
Em junho de 2015, durante reunião entre as equipes dos máxi Banque Populaire, Macif e Sodebo, foi criada a classe Ultim, cujos barcos deveriam ter comprimento total mínimo de 23 m e máximo de 32 m, o que excluiu veleiros como o Spindrift 2 (ex-BanquePopulaire V e atual Sails of Change), que tem mais de 40 m. A homologação da classe pela Federação Francesa de Vela aconteceu em 29 de janeiro de 2018. No entanto, a construção de veleiros acima dos 32 m continua, com vistas a estabelecer novos recordes de velocidade de volta ao mundo, com máxima de até mais de 50 nós (92,5 km/h).
Solo Ultim World Tour 2023, uma nova regata de volta ao mundo sem escalas
Em 2023, todos os principais maxitrimarãs da classe Ultim se encontrarão, para disputar a Solo Ultim World Tour 2023, uma regata histórica, a primeira com os maiores veleiros do mundo, os multicascos Ultim (dentro da regra 23/32 metros). Tendo a bordo apenas o skipper, os veleiros largarão de Brest (França), para onde retornarão depois de passar por boias virtuais próximas ao Rio de Janeiro e à Cidade do Cabo (África do Sul).
Já estão confirmados na regata os seguintes barcos:
Actual (Yves Le Blevec)
Banque Populaire XI (Armel Le Cléac'h)
Brest Ultim Sailing (TBC)
Gitana 17 (máxi Edmond de Rothschild; skipper Charles Caudrelier)
Sodebo 3 (Thomas Coville)
SVR-Lazartigue (François Gabart)
Assista ao vídeo de apresentação da Solo Ultim World Tour 2023: